A era de todas as incertezas

Novembro, 2018

O mundo, ao longo da história da vida, nunca foi um lugar seguro. O ser humano, em todas as eras, gerações e civilizações, esteve sempre ameaçado de qualquer forma: pela guerra, pela doença, pelos desafios da natureza, pelo choque das culturas e pelos conflitos de toda a ordem que caraterizam o relacionamento humano.

 Embora olhemos os conflitos como indesejáveis, o certo é que não existe mudança sem conflito e, sem conflitos, a humanidade não teria progredido com a mesma celeridade.

É óbvio que cada geração considera que os conflitos que está a viver são mais ameaçadores do que os das gerações anteriores. Na realidade, apesar da maior parte dos conflitos de natureza económica, política, militar ou social com que hoje nos defrontamos serem, tecnologicamente, mais complexos do que aqueles com que o ser humano se defrontava no século XVII face à Revolução Industrial, a angústia do artesão que viu desaparecer o seu negócio com a introdução das máquinas a vapor da industrialização em massa, não terá sido muito diferente do que sentem hoje muitas centenas de milhares de pessoas que estão ameaçadas de perder, ou já perderam, os seus postos de trabalho, devido à automatização dos processos e das respetivas profissões. Tal como na época da Revolução Industrial, as grandes mudanças tecnológicas são pródigas em incidentes de mal-estar e reações de multidões revoltadas.

Na Era da Informação e nos últimos anos, muitas profissões foram desaparecendo como consequência da preocupação de reduzir custos, aumentar a produtividade e otimizar processos quer na indústria, quer nos serviços. É inevitável que nos próximos anos a situação se generalize à grande maioria das profissões até agora consideradas não informatizáveis. Na realidade, o desenvolvimento acelerado de algoritmos com capacidade de aprendizagem coloca em risco quase todas as profissões.

No dia-a-dia, as manifestações de inquietude são cada vez mais frequentes. Recentemente, Lisboa e Porto têm vindo a assistir às manifestações dos taxistas que protestam contra novas formas de mobilidade que põem em causa os seus postos de trabalho. Trata-se de uma luta inglória, num processo que vai pôr em causa milhões de profissionais do volante, numa altura em que as viaturas autónomas são já uma realidade, em fase de teste. Nos setores da gestão das pessoas e nas áreas administrativas, os processos de automação são cada vez mais ameaçadores e põem em risco um número incalculável de postos de trabalho.

É certo que vão surgir novas profissões e que milhares de novos postos de trabalho serão criados. O problema é que ninguém sabe exatamente quais serão e como se poderão preparar para os ocupar.

O World Economic Forum editou, recentemente, o The Future of Jobs Report 2018 que abrangeu vinte economias, doze setores industriais e identificou as tendências da evolução do mundo do trabalho, no período de 2018 a 2022. Segundo as estatísticas, em 2022, as horas de trabalho serão partilhadas entre 58% pelos humanos e 42% pelos robôs. Mas para 2025, a proporção altera-se para 48% e 52%, respetivamente. Segundo o estudo, em 2022, as funções emergentes criarão 133 milhões de novas profissões. E todas elas têm na base a física, a matemática, as ciências e as tecnologias.

Num contexto educativo adormecido, no qual grande parte dos estudantes continua a ser treinado para funções que estão condenadas a desaparecer dentro de poucos anos, o futuro pertencerá àqueles que forem capazes de apostar na formação e na aquisição de novas competências. A escassez de profissionais com os skills necessários vai provocar uma alteração profunda nas relações no mundo do trabalho, com um incremento de profissionais e empresas que vão adotar sistemas flexíveis de contratação, de freelancers por projetos, trabalho temporário, outsourcing, etc. Para os mais jovens, a grande aposta do futuro reside no investimento educativo nas formações e nos cursos baseados, sobretudo, nas disciplinas STEM – Science, Technology, Engineering and Mathematics.

Embora a concretização destas ameaças possa surgir mais tarde em Portugal do que noutros países, os primeiros sinais só não são visíveis para quem não os quiser ver…

Para os jovens, como para os menos jovens, a apologia do lifelong learning nunca foi tão atual, nem tão premente…

Amândio da Fonseca

Fundador e Chairman da EGOR

*in RHOnline, 15 novembro 2018

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