Liderar o Banco do Futuro

Novembro, 2018

O sector financeiro em geral, e a banca em particular, sofreram profundas alterações nos últimos anos. Os impactos da tecnologia, da regulação e da competição, a par com o surgimento de um novo tipo de consumidor, tornaram a mudança norma e não apenas exceçºao. A pressão aumenta com as novas "fintech", que trazem ao sector mais tradicional da banca uma abordagem diferente à forma de fazer negócio.

Tudo está a mudar a um ritmo mais rápido do que a nossa noção de tempo – os mercados, os clientes, as tecnologias e os modelos sociais. A probabilidade substituiu a previsibilidade. Na nova era, a fidelidade dos clientes face à marca deixou de ser um dado adquirido e torna-se cada vez mais difícil de conquistar.

A tecnologia veio tornar a competição mais flexível. Trocar de banco passou a ser fácil. Cada vez mais, os novos consumidores valorizam acima de tudo a rapidez e a utilidade. Os clientes bancários são agora mais exigentes. Procuram serviços bancários a qualquer hora, em qualquer lugar e com o mínimo de deslocações possíveis. E uma comunicação de proximidade e em tempo real, que seja relevante e personalizada.

A natureza das carreiras na área da Banca também está a mudar. No desenvolvimento da estratégia de talento, é necessário identificar claramente as competências e o expertise necessários para competir no futuro, alinhar a estratégia de talento com a estratégia do negócio, e treinar, atrair e reter as pessoas com as competências críticas identificadas. Acresce que, atrair o melhor talento requer uma estratégia para contrariar a perceção de que a indústria da banca é conservadora e hierarquizada.

Neste novo mundo destacam-se as organizações ágeis e dinâmicas que se focam numa visão do futuro, concentrando a sua atuação nas possibilidades. Estas empresas estão continuamente a inovar, a reinventar e a criar mercados, produtos e serviços, e até mesmo modelos de negócio, promovendo o crescimento e o progresso. Para competirem na era digital, os bancos necessitam de colocar as pessoas em primeiro lugar e de gerir a mudança organizacional. É necessário evoluir para uma cultura centrada no cliente e implementar novas estruturas, processos e modelos de liderança, que possibilitem uma adaptação rápida aos avanços tenológicos, sem perder a humanidade.

Apenas reorganizando estruturas e processos em torno do cliente e do elemento humano, é possível promover a adaptação rápida aos avançados digitais e gerir a mudança organizacional de forma sustentável.

A nova ordem pede que os valores de adaptabilidade e não as regras, sejam usados como o princípio unificador que faz mover as equipas.  Um desafio, se pensarmos que ao longo dos últimos anos os processos organizacionais não foram construídos tendo em mente a adaptabilidade.

Pelo contrário, as instituições financeiras têm trabalhado no sentido de aumentar a rentabilidade e a eficiência dos processos, através da criação de estruturas e de rotinas rígidas. Grande parte delas foram concebidas para funcionar como máquinas destinadas a minimizar a incerteza, e por isso apresentam dificuldades de adaptação a mudanças no ambiente externo. De uma máquina espera-se que seja eficiente, não que reaja rapidamente ao imprevisto. Agora, está-lhes a ser pedido que façam o movimento contrário e que invistam a mesma quantidade de energia a reinventar os processos em torno da adaptabilidade.

A palavra chave no passado recente foi “Eficiência”. Nas últimas décadas foi prática corrente conquistar o crescimento recorrendo a estratégias cada vez mais sofisticadas de otimização e de maximização. Estamos agora na encruzilhada da transição para uma nova era, bastante mais complexa e imprevisível. No novo cenário, a orientação excessiva para a eficiência torna o sistema mais vulnerável. Precisamos de evoluir para organizações mais orgânicas, que espelham a natureza humana, capazes de responder rapidamente aos desafios. Caracterizadas pela descentralização, flexibilidade, interdependência entre colegas e unidades de negócio, comunicação multidirecional, iniciativa e cocriação.

Nas organizações orgânicas, a ênfase é colocada em dimensões como a eficácia, capacidade de resposta, flexibilidade, adaptabilidade, criatividade e inovação.

As soluções existem e passam por:

- Alimentar a conectividade entre as pessoas, fomentando o surgimento espontâneo de sinergias catalisadoras.

- Reconhecer a existência da imprevisibilidade e transformá-la numa fonte de aprendizagem.

- Premiar os empreendedores e os aventureiros, em lugar de afogá-los nas rotinas e nos processos do passado.

A mudança rápida e disruptiva, combinada com expectativas mais elevadas dos clientes e dos jovens que estão a integrar o mercado de trabalho, criaram um contexto para a emergência de líderes transformadores e de equipas mais autónomas, inovadoras e empáticas, que trabalham em rede o desenvolvimento de novos produtos e serviços.As máquinas não podem revelar verdadeira empatia. Pelo menos não por enquanto. Podemos criar inteligência artificial que imita a empatia, mas falta-lhe a energia gerada pela conexão humana. Apenas os seres humanos conseguem lidar com a ambiguidade e criar, conscientes do seu impacto no ecossistema.

O maior desafio não é por isso a tecnologia. São as mudanças organizacionais e comportamentais que é necessário implementar para acompanhar o compasso rápido da mudança. É necessário repensar modelos de reporting, quebrar os silos organizacionais e apostar num novo paradigma do desenvolvimento humano.

Precisamos de novas ideias, de novos valores, e de líderes humanos, que promovem a criatividade, a conexão e a proximidade. Não é possível concretizar uma mudança tão profunda de paradigma, insistindo em modelos de negócio e estilos de liderança desenquadrados do contexto, que colocam o Excel à frente das pessoas.  

Precisamos de organizações mais ágeis, feitas de pessoas capazes de analisar a informação, de solucionar desafios complexos e de lidar com a ambiguidade. Com vontade e desejo de aprender.  E criatividade, humildade e vulnerabilidade para imaginar soluções inovadoras.A indústria da Banca necessita de líderes corajosos e com convicção, que têm uma estratégia para lidar com a agenda da mudança e criar ambientes de trabalho que celebram e dão prioridade às competências humanas.

Em primeiro lugar, é urgente investir na cultura do “Propósito”. Quando as organizações começarem a mapear a sua estratégia e a planear, tendo por base a razão de ser do negócio, o espírito de equipa sairá reforçado, pois todos entendem o porquê do que estão a fazer e sentem-se ligados por uma força inspiradora que os ajuda a enfrentar os desafios com resiliência. 

Em segundo lugar, é necessário investir nas qualidades humanas que sustentam uma organização orgânica, tais como a capacidade de resposta, a flexibilidade, a adaptabilidade, a criatividade e a inovação. São estas qualidades que possibilitam a descentralização da tomada de decisão, a delegação e a colaboração. Em simultâneo, é necessário desenvolver qualidades de carácter como a resiliência, a curiosidade, a imaginação, a intuição, a humildade e a vulnerabilidade.

Em terceiro lugar, é necessário estímulo intelectual, para encorajar a inovação e a criatividade. Ora a criatividade não é compatível com uma postura rígida e com a excessiva especialização. A criatividade circula no meio ambiente como o ar que respiramos. Está em todo o lado enquanto energia em potencial, convidando-nos a participar com uma postura de abertura. Comunidades artísticas, companhias de teatro, orquestras, galerias e companhias de dança são excelentes laboratórios para o desenvolvimento destas novas competências porque a cultura é um denominador comum que mantém viva a comunicação na diversidade.

Um pouco por todo o mundo esta fusão já teve início. A IEDC, uma escola de gestão na Eslovénia reconhecida por Peter druker como sendo a melhor escola de gestão no mundo, está empenhada em introduzir o processo artístico no seu MBA para executivos e dedica uma semana inteira do programa às artes. Outras formações em liderança recorrem ao músicos de jazz enquanto mestres na arte da desaprendizagem, reconhecendo que o  maior inimigo da improvisação no jazz são as rotinas, os hábitos e as armadilhas do sucesso.

Contudo, no sector bancário não é suficiente criar novos produtos e serviços. É preciso produzir ideias e soluções que tenham impacto na sociedade. Só assim é possível desenvolver projetos rentáveis e sustentáveis.

Procuramos líderes com uma consciência cultural e ética. Líderes que fazem uso do compasso moral, para lidar com dilemas éticos e morais.  Estes líderes estão empenhados no crescimento sustentável. Cultivam relações de confiança com todos os parceiros e procuram maximizar o retorno para as partes envolvidas: colaboradores consumidores, comunidades e investidores.

Esta dimensão da liderança assume particular relevância, se pensarmos que os consumidores esperam uma atitude ética por parte dos bancos, nas comunidades onde operam. Instalou-se a perceção de que o sector dos serviços financeiros é menos ético do que outras áreas de negócio e é necessário combater isso. E de facto, os bancos, podem assumir um papel importante na economia, tendo a capacidade de influenciar empresas e clientes em todos os sectores, através dos seus produtos e serviços.

O comportamento ético profissional não é apenas uma virtude; permite restabelecer a confiança e a fé nas instituições financeiras. Não é uma limitação, mas antes um pré-requisito que garante a sustentabilidade do sector financeiro. Este desejo de olhar ao redor e pensar onde podemos fazer a diferença não pode ser replicado pelas máquinas. Reaprender a ser humano é o maior desafio que os líderes e equipas enfrentam hoje.

Nos últimos anos, desenvolvi, testei e apliquei um modelo para promover o desenvolvimento das competências de liderança para uma nova economia, a par com o lançamento de um livro nos EUA sobre o tema, com o título “The 22 Powers of Leadership—archetypal Journey to awaken the leader within” O prefácio foi escrito por Shiv Vikram Khemha, já considerado um dos líderes do futuro na conferência de Davos e chairman da “Global Education and Leadership Foundation” uma instituição que apoia o desenvolvimento dos líderes do futuro, em parceria com Universidades em todo o mundo.

Este programa foi desenhado para executivos e gestores que queiram desenvolver uma liderança inspiradora e liderar a mudança num contexto complexo e ambíguo. É uma abordagem que inspira e desenvolve pessoas e possibilita o fortalecimento do Propósito, da liderança e do espírito de equipa.Trabalha o líder enquanto arquiteto de possibilidades, enfatizando o entendimento do contexto e as qualidades e competências humanas que sustentam a liderança que inspira a mudança sustentável.A abordagem é humana, orgânica, profunda e original, ao traduzir numa metodologia prática e ao mesmo tempo sistémica, a sabedoria milenar contida nos símbolos arquetípicos, combinada com o conhecimento académico e conhecimentos de comportamento organizacional e da neurociência.

Trata-se de um processo de reflexão assente num framework multidimensional em formato de gamificação com um tabuleiro, cartas com ilustrações poderosas baseadas na estrutura mitológica de arquétipos ancestrais e livros de apoio ricos em conteúdos relevantes para os desafios da nova economia, que ajudam cada pessoa a conectar-se com a sua humanidade e as qualidades de liderança que sustentam empresas orgânicas.

Reúne o poder associativo da fototerapia e da imagem com perguntas e pensamentos provocadores. Convida a abrir a mente a novas possibilidades e pontos de vista. As dimensões racional e intuitiva são ativadas, combinando-se para criar novas associações que permitem observar os dilemas e explorar soluções organizacionais e de liderança, a partir de um novo ângulo.

As dinâmicas individuais e de grupo, recorrem a exercícios projetivos, técnicas de coaching sistémico, design thinking e arte, para trabalhar as competências individuais e de grupo, que nos tornam mais humanos, mais adaptáveis, flexíveis e aventureiros, num mundo complexo e em mudança.O programa, que percorre o caminho da inspiração à implementação, tem sido aplicado em Portugal e no estrangeiro com sucesso, junto de Executivos de Topo. Empresas dos mais variados setores e muitas no setor financeiro, adotaram esta metodologia.

É um processo estruturado que disponibiliza tempo aos participantes para fazerem uma pausa e confrontarem-se consigo próprios e com os desafios de equipa e da liderança, a partir de diferentes pontos de vista.Ao mesmo tempo disponibiliza insights práticos, objetivos e sistematizados, que ajudam a fazer o caminho da aspiração à implementação, no desafio que é liderar e inspirar um novo paradigma de negócio.

Sofia Costa Quintas

Diretora Executiva da Egor Alchemy

in Inforbanca, Novembro 2018

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