Março de 2021
Entrevista a Vítor Figueiredo, CEO Zolve Logística
1 - Num ano tão atípico e que colocou em causa toda a previsibilidade dos negócios da generalidade das empresas, quais os aspetos que considera terem sido mais críticos?
A pandemia mundial que estamos a atravessar representa um desafio a nível global e os seus efeitos são transversais a todas as áreas de atividade.
Numa primeira instância, toda a cadeia de abastecimento foi posta à prova. Havia uma crença global de que poderia colapsar devido à imprevisibilidade vivida. Foi um teste duro, mas a cadeia de abastecimento em geral deu uma resposta de grande robustez garantindo um abastecimento ininterrupto de praticamente todos os bens.
Por outro lado, a pandemia Covid-19 veio servir como um acelerador significativo quer da omnicanalidade quer na tendência de aumento do comércio de proximidade. Nestes 2 aspetos, não diríamos que a pandemia vai alterar as tendências que já existiam, mas sim acelerá-las de uma forma muito significativa.
No que diz respeito à forma como está organizada a cadeia de abastecimento, antecipamos um impacto profundo em determinados paradigmas que pensávamos abandonados. As principais variações que nos parecem pertinentes destacar são:
- Aumento dos stocks mínimos o que será mais visível em produtos com menor grau de perecibilidade
- Maior dispersão geográfica dos centros de distribuição. As grandes concentrações associadas a centros de distribuição de grande dimensão acabam por tornar a cadeia mais exposta a uma situação pandémica e nem sempre se coadunam com uma distribuição mais capilar. É assim de esperar alguma descentralização e redundância que naturalmente irá diminuir alguns ganhos de escala
- Maior troca de informação e transparência entre os vários intervenientes da cadeia no sentido de antecipar ruturas e poder partilhar stocks com vista a fazer face a uma maior incerteza. Esta será certamente uma forma de tornar a cadeia mais robusta. É algo que já acontecia, mas que com certeza se vai intensificar.
2 – As ocorrências de grande impacto, obrigam inevitavelmente a tomada de decisões inerentes a mitigar esse mesmo impacto. No ano que agora findou, a sua empresa tomou alguma decisão particularmente importante e com impacto, sobretudo, no futuro próximo?
O ano de 2020 foi um ano de alterações muito significativas para a nossa empresa. A maioria das mesmas já estava programada antes da pandemia, mas o facto de que a pandemia não as colocou nem causa, nem as atrasou já foi, só por si um grande desafio. Destaco 2 eventos muito significativos, o primeiro está relacionado com a alteração acionista que ficou formalizada em junho. Depois de 20 anos como parte do grupo Greenyard, a empresa passou a ter capital português no seguimento de um processo de MBO do qual tive a honra de fazer parte. Passar a ter o centro de decisão mais próximo do negócio vai permitir à nossa empresa reagir com maior agilidade aos grandes desafios de um mercado em alterações profundas.
Adicionalmente, foi em março, em plena 1º vaga da pandemia, que abrimos o nosso centro de distribuição em Vila do Conde. Estas instalações vão permitir-nos servir, de maneira mais eficaz, toda a região norte.
3 – As organizações preparam-se para iniciar a retoma económica e elaboram todo um planeamento nesse sentido. No âmbito dos RH projeta proceder a alterações? Concretamente, quais?
Num mundo em que a tecnologia está cada vez mais integrada nos procedimentos, as empresas tendem a ser cada vez mais iguais. No entanto, isso eleva os RH de cada organização para um patamar de maior importância. A racionalidade da tecnologia precisa de ser combinada com o sentimento, atrevimento e antecipação a imprevisibilidades que só as pessoas conseguem incorporar em cada tarefa. O grande desafio da nossa organização em termos de RH, está relacionado com a capacidade deixar que as máquinas, sistemas e procedimentos assegurem o presente, enquanto os RH se focam quer na relação com o cliente, quer na adaptação do negócio para o futuro. Para isso, é fundamental criar uma cultura de inovação e melhoria contínua, um sentimento de pertença e uma capacidade de treinar novos elementos de cada equipa. Apenas as organizações que façam esta transição poderão dizer-se preparadas para o futuro. É um processo que nunca para e é aí que está o foco da Zolve no que diz respeito às suas pessoas.
4 – Se pudesse eleger um ou outro fator que, apesar de tudo, considera positivo, qual seria?
O sentimento de realização consegue-se em ambientes mais adversos como os que vivemos. O cenário altamente atípico que atravessamos faz-nos dar mais valor às coisas que são realmente importantes quer a nível pessoal, quer também a nível profissional. Quando a pandemia acabar, saberemos todos olhar para o futuro de uma maneira diferente.
5 - Como vê o ano de 2021, em termos da retoma económica, quer ao nível do seu negócio, quer ao nível do país?
Acreditamos que o ano de 2021, principalmente no seu segundo semestre, será um ano de viragem. Apesar de os efeitos negativos que a pandemia certamente terá na economia, a capacidade de recuperar dependerá essencialmente da velocidade de recuperação dos empregos perdidos. A queda foi muito abrupta, mas a recuperação também pode ser se as pessoas se voltarem a sentir seguras. O turismo tem um papel fundamental na nossa economia e Portugal, pelas características que conhecemos será um dos principais destinos de férias de uma Europa sedenta de sair de casa. Encaramos por isso o futuro com otimismo.